A fumaça que toma conta dos nossos dias e pulmões nesses meses de verão amazônico causticante encobre, na verdade, a impunidade dos verdadeiros responsáveis por esse crime que se repete a cada ano contra a humanidade. Não tivessem a certeza da impunidade, esses irresponsáveis travestidos de produtores rurais na ânsia de aumentar os limites de suas propriedades e utilizando métodos arcaicos de produção não recorreriam ao fogo.
Até quando iremos suportar essa vergonhosa condição? Contratar bombeiros para combater o problema depois que ele se instala é chover no molhado. Medida inútil, sem repercussão prática, um peso morto a mais para o governo que assume os custos das operações depois que a nuvem de fumaça tóxica já está em deslocamento.
A pergunta que não quer calar: por que não punir com prisão os responsáveis? Por que não promover o confisco de propriedades em que são registrados focos de incêndio ou de propriedades que estejam situadas nas proximidades da áreas atingidas? Por que não aprofundar as investigações e apresentar à sociedade os verdadeiros responsáveis?
Vale tudo nesse enfrentamento, desde montar campanas para flagrar o momento em que esses criminosos agem a oferecer recompensas para quem apontar responsáveis por queimadas e provar com imagens.
É preciso fazer algo urgentemente. A intensidade do calor e dos fenômenos climáticos está cada dia pior e sofremos com as consequências disso. Quanto mais quente, mais seco. Quanto mais seco, mais propício o ambiente para a propagação do fogo e a permanência em suspenso das partículas que integram a fumaça resultante da queima de vegetação. Essa fumaça não se dissipa.
Importante alerta feito pela Fiocruz Amazônia semana passada que recomendou o uso de máscaras sobretudo aos idosos e portadores de comorbidades respiratórias. De forma oportuna, o epidemiologista e pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana, chamou atenção para a antecipação do período crítico de intensificação da fumaça proveniente das queimadas. Segundo ele, o que mais preocupa este ano é que “não se sabe, ao certo, se o que está acontecendo é simplesmente uma antecipação do período crítico ou se, realmente, este ano, teremos um período mais longo de exposição à fumaça tóxica, já que o pico da poluição em 2023 foi em outubro. Seria algo inusitado e extremamente preocupante, pois estenderia o sofrimento da população e traria consequências ainda piores”, afirmou Orellana.
O pesquisador foi enfático ao afirmar que os efeitos da fumaça sobre a saúde podem ser facilmente identificados, como tosse seca, sensação de falta de ar, irritação dos olhos e garganta, congestão nasal ou alergias na pele. A fumaça pode também contribuir para o agravamento de doenças cardiovasculares e respiratórias como rinite, asma, bronquite, doença pulmonar obstrutiva crônica ou mesmo Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).
Outro efeito negativo apontado pelo pesquisador da Fiocruz Amazônia é o impacto sobre a saúde mental de pessoas mais vulneráveis, uma vez que os níveis elevados de poluição atmosférica aumentam suas preocupações e incertezas, além de limitarem atividades de lazer ou terapêuticas ao ar livre.
É uma situação gravíssima que espalha prejuízos em todas as direções, e que lamentavelmente já faz parte do nosso calendário. Isso exige muito do consórcio e do mutirão dos Três Poderes e das três esferas de governo, e que passa necessariamente pela extinção da certeza da impunidade.
Por: *Augusto Bernardo Cecílio