Augusto Bernardo Cecílio
Em idade escolar, lá em Parintins, sempre me via entrando em fila pra tomar vacina. Tirando o medo que as crianças sentiam, ninguém questionava a origem da vacina e não havia essa desinformação orquestrada que agora vivenciamos. Hoje, devidamente vacinado na data certa com as duas doses da Coronavac, e a de reforço da Pfizer, contemplo a atual evasão com uma mistura de incredulidade e irritação.
Quando alguém reage, faz caras e bocas e diz que não quer receber a vacina, claramente aí está carimbada a sua tendência política. Ou melhor, a tal da ideologia. E os detentores do poder têm boa dose de culpa dessa ocorrência, até porque, sendo o povo brasileiro muito carente de ídolos, muitos vão “na onda” de políticos e acabam ficando expostos ou expondo inocentes.
O resultado todos sabemos: enquanto os que comandam se “hospedam” nos hospitais de referência em São Paulo, recebendo um tratamento de ponta, os pobres se amontoam em corredores de hospitais, ou morrem sem oxigênio ou sem leito.
Percebe-se que sistematicamente as vacinas tradicionais estão sendo deixadas de lado, e aí nem culpo a tal ideologia, pois bem antes do atual momento já vinha caindo drasticamente a presença de pais com os seus filhos nos postos e nas campanhas de vacinação. Algo triste e extremamente preocupante.
Segundo a UNICEF, anualmente, quase dois milhões de crianças em todo o mundo ainda morrem por falta de acesso às vacinas. Nos últimos anos estamos observando uma queda nas aplicações das chamadas vacinas pentavalente (que protegem contra difteria, tétano, coqueluche, meningite) e BCG (que protege contra a tuberculose), o que fez com que a cobertura vacinal caísse de 98% para 90%, segundo dados do Programa Nacional de Imunização.
As vacinações tradicionais e rotineiras estão ficando abaixo do esperado em pelo menos seis tipos de vacinas: hepatite A, rotavírus, influenza, HPV, poliomielite, pentavalente e meningocócica C, sobretudo, em crianças, simplesmente porque existe um grupo de pessoas que não quer levar os seus filhos pela suposta ideia de que as vacinas trariam reações, tais como danos cerebrais e autismo, ou por questões ideológicas, religiosas e culturais, ou pela resistência à imposição da indústria farmacêutica.
Infelizmente, pela força das redes sociais, muitas desinformações se propagam e grudam nas pessoas como verdadeiras, sem a menor base científica. A classe médica precisa desmentir e se posicionar com firmeza, informando com exatidão e com conhecimento técnico sobre a importância de se ter uma cobertura vacinal para prevenir certas doenças, até pra evitar o risco do retorno de males que já estão controlados.
Engraçado, tem gente que não sabe nem porque o carneiro faz cocô redondinho e fica dando palpite sobre um assunto extremamente sério que é a saúde pública. E aí entra a pandemia como mais um problema a ser enfrentado com firmeza e responsabilidade.
Por fim, os danos da recusa em tomar vacina vão além do prejuízo individual: impactam a saúde do outro, a rede assistencial pública, o trabalho da ciência e até a economia de um Estado ou de um país.
Auditor fiscal e professor.